Na pré-estréia de Pá-pírus, que durou apenas um dia (20.jul.2008), não houve trilha incidental. Para uma temporada longa, Carbon kid e Eu, achávamos imprescindível uma trilha sonora durante o tempo em que ocuparíamos a sala do poeta.
A primeira idéia foi um pequeno toca-discos de vinil. Não encontramos. Então, pintou um hi-fi (hight fidelity) doado pelo Clube de Mães de Ipanema. Era um móvel com um rádio antiquíssimo com amplificador de válvulas e duas entradas. O básico para violão e voz e até tinha um alto falante super Power. Mas aquele belo móvel estava quebrado (a saga da restauração continua).
Estávamos frustrados, sem som a funcionalidade da sala do poeta poderia perder um pouco do seu brilho. Mas, Eu, o Famoso Quem (?), não sou de me entregar tão fácil e durante a arrumação da exposição ví a luz...
- Sim, teríamos som e ficaria pronto de um dia para outro!
Horas na rua, no gelo do inverno, serrando e pregando; hora pintando (acrílico marfim); horas secando com uma estufa. O trabalho adentrou madrugada fria. Ficou pronto. Pior, a acústica era muito boa.
Misturando uma caixa de madeira, recolhida da rua; um rádio com leitor de cd quebrado, mas com toca fitas funcionando; mais a minha “magistraleclética” coleção de fitas cassete, construí uma caixa de música.
Coloquei uma tampa de alçapão, tranca com cadeado pequeno. Mas, faltava um tchamnnnnn na caixa que eu não poderia dar em virtude das arrumações finais da instalação poética. Confiei a tarefa ao Carbon Kid e sua arte compulsiva. Antes de começar ele me perguntou o queria ver tatuado na tampa da caixa. Sem pensar respondi o que veio primeiro a minha cabeça: -“Uma salamandra mística”.
Não deu outra coisa, o trabalho ficou estupendo, tornou-se um “must” e encantou um número considerado de expectadores. Foi assim que se criou “A Caixa Musical da Salamandra Mística”.
Da caixa musical fluiu um som que certas horas invadia os imensos vazios arquitetônicos da Usina do gasômetro. Provocando emoções totalmente indescritíveis. Como o prazer de ouvir ecoar os 15 segundos de acordes vocais finais de “Carinhoso”, por Elis Regina; a voz de Billie Holiday dando voltas pelo ar, atingido os pontos mais altos da construção; as melodias de tom Jobim passeando livremente.
Era possível escutar Júpiter Maçã, um “Bolero” de Havel, seguido de um Jackson Five, Os Tenores e os Trinados vigorosos de Pavarotti. Não faltou Sinatra, Gal Costa, Litle Richards, Pixinguinha, James Brow, Clementina de Jesus e seu afro-som, Ray Charles, João da Baiana, Louis Armstrong e uma profusão de estilos de Jazz, blues e sambas.
Não poderíamos esquecer, o brilhante "Tom Zé", que apesar da fama internacional, surpreendeu os mais desinformados. Ele nos inspirou no clip "A caixa Musical da Salamandra Mística" e a ele dedicamos modestamente este trabalho.
No rock entre tantas citações fazemos as seguintes: le tigre, autoramas, nirvana, grandaddy, stratopumas, Dirty, Planondas, cansei de ser sexy, placebo, smiths, starflyer59.
Ah! “Os Demônios da Garoa”. Todas as vezes que executamos músicas deles, a interação acontecia rapidamente. Vinham elogios, olhares curiosos e divertidos, sempre alguém cantarolava os velhos sucessos da década de 40, do século passado, dos Demônios, enquanto apreciava a instalação poética. Outros, mais ao fundo, nos bancos, batiam o pezinho e gingando a cabeça, sorriam descontraidamente. Muitos sorrisos por todos os cantos.
Através dos versos simples e diretos do compositor de música popular Adoniram Barboza, em Trem das Onze (“... não posso ficar/ nem mais um minuto com você/sinto muito amor,/mas não pode ser...”), na interpretação dos Demônios, concluímos que a arte verdadeiramente popular é imune ao tempo. Resiste a tudo e a todos, não podendo ser comparada com a feita pelos músicos atuais tidos como “medalhões da MPB”. Estes, mesmo tendo prestado serviços relevantes à cultura nacional, se tornaram artistas burocráticos de um público seletivo. De popular somente têm o rótulo que aplicam as suas canções.
Pensando nisso, em outra ocasião, penso que deveríamos providenciar canções do genial compositor portoalegrense Lupicínio Rodrigues.
A próxima historia será sobre o Violão Fantasma. Já tem no youtube.com, 3 clips com o violão fantasma.