No Brasil de hoje o “Interesse Público” definitivamente deixou nortear as ações de nossos governantes. Obcecados pelo lucro fácil e a sustentabilidade no poder, eles deixam de servir ao povo que os conduziu ao poder para atender os interesses das camadas mais abastadas da sociedade.
Em Porto Alegre, coisa não é diferente. Avessos às necessidades da sociedade o governo do estado e do município projetam obras faraônicas para a posteridade sem antes resolver os problemas da realidade. Usando dinheiro público e a copa do mundo de 2014 como desculpa as negociatas vem se sucedendo numa velocidade jamais vista.
Vejam-se alguns aspectos no caso da Arena do Grêmio:
1. A área negociada para construção do estádio havia sido doada de maneira formal ao Círculo Operário, há 50 anos atrás. Sem qualquer argumentação jurídica plausível esta doação foi ignorada;
2. De forma sintética o negócio se deu nos seguintes termos: O governo do Estado trocou a área para construção do Estádio, no bairro Humaitá, por outra situada na Estrada Costa Gama, zona sul da cidade, de propriedade dos empreendedores. A área do Humaitá foi avaliada em R$ 35 milhões de reais; já a área da zona sul em R$ 3 milhões de reais. Um desfalque no patrimônio público de R$ 32 milhões de reais feito na cara dura;
3. O projeto prejudica a mobilidade urbana. O entroncamento Free Way/Farrapos com BR 116, na entrada principal da cidade, atinge momentos críticos com paralisação total de fluxo nos horários de Pico. Em dias de jogos importantes, a circulação de 70 mil pessoas no bairro Humaitá causará um verdadeiro pandemônio na entrada ou saída da cidade.
4. Duas escolas e um CTG, além dos últimos campos de várzea estão sendo expulsos do local onde será construído o estádio;
5. Para construção do estádio será concedida a isenção de impostos. Isenção implica em abrir mão de arrecadação de impostos. Imposto é dinheiro do povo. Este dinheiro vem do suor do trabalhador;
6. Existem outros aspectos ligados ao torcedor gremista, que antes tinha orgulho de assistir seu time na sua pró pria casa. E agora passará a torcer na casa de baianos. Pois, a construtora da arena será a única dona do estádio durante 20 anos. Esta empresa pertence à família do falecido Antonio Carlos Magalhães (Toninho Malvadeza), cuja saga dispensa qualquer comentário. Todos os sócios, inclusive os sócios patrimoniais, terão que pagar ingresso.
7. Prédios de até 72 metros projetados para as imediações do estádio, podem comprometer a segurança do tráfego do aeroporto Salgado Filho e vizinhança.
Imagem H. Wittler - Desenho Tânio J. Faillace
Cais Mauá - Centro - Porto Alegre
Porto sob a ameaça da especulação imobiliária predatória
O Cais Mauá, centro da capital gaúcha, também não está livre das atrocidades urbanísticas e negociatas. O projeto de revitalização do cais alardeado como a salvação do centro da cidade, tem como obras principais a construção de torres de 100 metros de altura próximas à rodoviária e a construção de um apart hotel e um shopping Center nas imediações da Usina do Gasômetro.
O objetivo neste caso é bastante explicito, o projeto tem por escopo a privatização da orla pública. O governo do estado quer entregar aos empresários o melhor ponto do centro da cidade. Pois, se quisesse realmente melhorar o centro da cidade pensaria em sanar os problemas do calçamento irregular, da segurança dos transeuntes, sobretaxaria os imóveis desocupados, promoveria incentivo à restauração dos prédios antigos, recuperaria as praças públicas e ofereceria tratamento humanitário aos moradores de rua.
" Não são prédios isolados no cais que devolverão a importância perdida e a dignidade ao centro da cidade."
" Não são prédios isolados no cais que devolverão a importância perdida e a dignidade ao centro da cidade."
Inconveniências do Projeto de Revitalização do Cais Mauá proposto pelo governo do estado:
1. O projeto causa impacto negativo na mobilidade urbana. A Avenida Mauá e Avenida Castelo Branco são vias notoriamente saturadas; qualquer projeto sem alternativas viárias causará estagnação completa do trânsito de veículos no centro da cidade. Estima-se que os dois projetos implicarão no aumento de 5.000 veículos a mais no centro da cidade;
2. Para construção do shopping e hotel um dos galpões será demolido. Logo, além da descaracterização do conjunto arquitetônico, haverá perda irreparável de patrimônio público histórico;
3. O projeto não contempla a situação dos prédios abandonados na Avenida Mauá. Local onde tranquilamente poderia se desenvolver a hotelaria e prédios voltados à prestação de serviços;
4. O projeto tenta privatizar patrimônio cultural brasileiro. Vejamos o que diz a nossa constituição:
“Art. 226. Constituem patrimônio cultural brasileiro os bens de natureza material e imaterial, tomados individualmente ou em conjunto, portadores de referência à identidade, à ação, à memória dos diferentes grupos formadores da sociedade brasileira, nos quais se incluem;
I - as formas de expressão;
II - os modos de criar, fazer e viver;
III - as criações científicas, artísticas e tecnológicas;
IV - as obras, objetos, documentos, edificações e demais espaços destinados às manifestações artístico-culturais;
V - os conjuntos urbanos e sítios de valor histórico, paisagístico, artístico, arqueológico, paleontológico, ecológico e científico.
Para terminar o assunto do cais, citamos o exemplo da Feira Rural Brasil Contemporâneo. Esta feira comprovou que o Cais Mauá pode vir a se tornar um atrativo cultural para a cidade; sem qualquer obra faraônica, que implique em descaracterização do conjunto arquitetônico, poluição do visual ou privatização da orla pública.